João Baptista Herkenhoff
Quando
criança, em Cachoeiro, o ritual das cinzas me assustava. O sacerdote,
fazendo uma cruz, colocava partículas das cinzas na testa dos fiéis, que
se postavam em fila. Não eram as cinzas que me causavam arrepio, mas a
frase fúnebre, pronunciada com augusta solenidade: “Memento homo, quia
pulvis es, et in pulverem reverteris.” (Lembra-te, homem, de que és pó e
em pó te hás de tornar).
A
Quarta-Feira de Cinzas assinala o início da Quaresma. Não só a Igreja
Católica celebra o tempo quaresmal. Também a Igreja Luterana, a Igreja
Presbiteriana, a Igreja Anglicana e outras Igrejas Cristãs debruçam-se,
com reverência, nesta quadra do calendário, à face do mistério do Cristo
que foi crucificado e ressuscitou.
Algumas
Igrejas Cristãs, que guardam a Quaresma, não adotam o ritual da
imposição das Cinzas, uma tradição católica que leva milhões de pessoas
às igrejas, pelo mundo afora.
Nestes
tempos de Ecumenismo, de um Papa profundamente ecumênico, todos os
cristãos devem dar as mãos para construir um mundo mais humano. O
Cristo pediu a unidade, o Cristo quer a unidade, o Cristo é a unidade.
Para
além do domínio cristão, creio que celebram a memória do Crucificado,
mesmo sem pronunciar Seu Nome (Mateus, 7, 21), todos aqueles que
abominam as exclusões e as discriminações, todos que lutam para
construir um mundo de Fraternidade.
A promessa de Jesus Cristo, na última Ceia, não pode, de forma alguma, encerrar-se nos arraiais da fé católica.
Onde
se celebre a Ceia cristã, em memória do Ressuscitado, na Esperança do
advento do Reino definitivo e na luta pelo Reino provisório, que deve
ser um Reino de Justiça, ali se repete a Ceia do Senhor.
Eucaristia
e Justiça são inseparáveis. Comunga o Senhor Jesus quem comunga o
Irmão, quem socorre o fraco, quem enfrenta a onipotência do opressor,
quem se solidariza com o oprimido.
Jesus
Cristo pode estar em toda parte. Mas o Cristo está sobretudo no meio
dos operários, nas favelas, nos hospitais, nas prisões. Ali onde estão
os pequeninos, os desabrigados, os marginalizados, ali está o Cristo
Libertador, como anúncio de Esperança, consolo dos aflitos, auxílio dos
que sofrem.
O livro do Deuteronômio contém este preceito:
"Buscarás a Justiça, unicamente a Justiça, para que possas viver".
Buscarás a Justiça, e não apenas aprovarás ou aplaudirás a Justiça — esta é a advertência do Profeta.
Na segunda parte do versículo temos a conclusão: para que possas viver.
A Justiça é condição de sobrevivência. Só uma sociedade justa pode sobreviver.
João Baptista Herkenhoff é Juiz de Direito aposentado (ES) e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com. br
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/ 2197242784380520
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